A Passagem


“Um monte de imagens quebradas, onde bate o sol,
E a árvore morta não oferece abrigo, nem o grilo, alívio,
Nem a pedra seca, barulho de água. Só
há sombra sobre esta rocha vermelha
(Vem para sombra desta rocha vermelha),
E eu te mostrarei uma coisa diferente de
Tua sombra que pela manhã anda atrás de ti
Ou de tua sombra que à tarde se ergue para receber-te;
Eu te mostrarei o medo num punhado de pó”.

T. S. Elliot
As Terras Devastadas



Prólogo


Assim como existe na natureza lugares onde a expressão do Belo se dá de forma sublime e total, também existem lugares onde a Devastação, a Podridão e a Morte dominam por completo. Em tais lugares não é difícil encontrar manifestações doentias da natureza, espíritos de fogo que soerguem-se do solo, empesteando ainda mais o já bolorento ar a sua volta. Tão fácil encontrar criaturas terríveis nestes campos quanto os belos pássaros naqueles, insetos e répteis pestilentos nestes e mamíferos graciosos naqueles. Em um destes lugares amaldiçoados pela existência, em lugar que não se deve precisar, há um poço de pedras negras, dominado pelo musgo. Há algum tempo atrás uma cidade tentou estabelecer-se na região, mas as fundações não agüentavam e cediam facilmente sobre o solo traiçoeiro. À noite os uivos dos animais selvagens assustavam os que tentavam permanecer e os frutos da terra eram intragáveis. Apenas uma morada se elevou e permaneceu. Seu construtor, um velho judeu, fugido de sua pátria. Foi ele quem construiu o poço com os próprios punhos. Os antigos dizem que tal empreitada só poderia ter sido concluída com a ajuda de forças demoníacas, mas o que sabem os antigos, afinal. Todos repletos de velhos preconceitos e superstições... e nem todas são procedentes, nem todas...
O que resta de racional nesta história é que o velho judeu construiu sua casa e seu poço e dele se alimentou durante trinta anos, até que desapareceu da mente das pessoas. Restaram apenas as histórias fantásticas sobre o misantropo, imaginadas por aqueles que fugiram daquelas terras desoladas. Uma delas começa assim...


“Cogito Ergo Sum”.[1]


Intersecção



... a escuridão ... apenas uma completa e sufocante escuridão. Até onde sua visão pode alcançar só consegue distinguir uma forma amorfa de uma construção. Ele não consegue desviar seus olhos dessa visão ao longe e nem seus pés conseguem parar e descansar. Há só uma incessante e incansável caminhada em direção ao lugar onde algo o chama, e ele não consegue oferecer resistência alguma a este chamado, só sente esse estranho e terrível fascínio pelo o que está a sua frente.
Não há nada neste lugar, bem verdade seja dita, a palavra “desolação” seria mais apropriada, nenhuma árvore, nenhum ser vivo animal ou vegetal, apenas pó e aridez. Nem o vento ousa soprar por estas terras, apenas o calor e algo mais, algo pesado que parece pairar sobre seus ombros e com uma incrível força fazer seus joelhos dobrarem.
Depois de mais algum tempo de custosa caminhada o andarilho finalmente chega perto da construção que vira ao longe. Ele vê uma casa de pedra muito antiga e mal cuidada, e em algumas partes ela assume uma geometria logicamente impossível, há também uma pequena área antes da porta de entrada e acima dela paira duas janelas perpendiculares à porta, ele olha para o todo e sente-se desconfortável, pois isto o faz lembrar de um rosto de algo velho e decadente, mas pronto para devorar a presa que dali se aproximar. Por um instante ele imagina esta cena, um calafrio percorre todo o seu corpo, mas ele logo deixa de lado, isto é apenas sua mente brincando com suas percepções.
Ele dá mais alguns passos e agora também consegue distinguir a forma de um poço alguns metros a frente da casa. E há mais que isso, ao ir mais adiante ele enxerga uma pessoa sentada na beirada do poço. Ele estaca onde está suas narinas são invadidas por um fedor azedo, saturado em vapor ocre, vindo daquela direção. O estranho que estava ali sentado, fica de pé frente ao poço, o andarilho percebe que é um velho. Ao encarar o velho pela segunda vez neste dia ele sente medo, pois o sorriso do velho não é humano, ele sorri para o andarilho e sua boca se abre num esgar impossível, que chega a tomar quase todo o seu rosto sendo os dentes que aparecem por trás desse sorriso centenas, não, milhares de dentes pontiagudos. O velho avança um pouco para frente e estende suas mãos que parecem garras em direção o andarilho. Ele não consegue mexer-se, apenas um grito aterrorizador escapa de sua garganta.
... toc... toc... bum... bum...
Fagin acorda com batidas na porta do seu quarto, ele está todo suado e sua cama ensopada.
- Fagin, está tudo bem? – alguém fala do outro lado da porta – eu ouvi você gritar.
- Está tudo bem!Foi só um sonho ruim, não precisa se incomodar.
- Tá tudo bem, tem certeza.
- Sim. Pode ir dormir.
- Bem... Então, boa noite.
- Boa noite.
Novamente aquele sonho, aquele lugar e aquela coisa. Toda a noite este sonho recorrente. Ele fica mais algum tempo pensando sobre isto antes de adormecer novamente.


Histórias e Estórias...


No início do século passado à migração era o caminho da fortuna naquele país. Centenas de imigrantes vindos de todas as partes do mundo chegavam e instalavam-se, abrindo estradas, comércio, campos de pastagem e agricultura em busca de sucesso. As terras eram baratas e quase inexploradas. O maior preço a pagar era a grande possibilidade de encontrar-se com feras selvagens e doenças ainda não catalogadas. E os nativos, é claro. Os imigrantes vinham, como já foi dito, de quase todos os lugares, transformando o país numa colcha de retalhos cultural, terra de ninguém e de todos, terra da esperança. Os judeus da Rússia começaram o comércio de quinquilharias de toda espécie. Os italianos abriram a agricultura, os alemães a pecuária. Os franceses tinham várias ocupações, entre elas a mais rentável e estável na construção civil. Os ingleses investiram nas madeireiras, bem como os espanhóis, que também tinham um pé nas minas de ouro e jóias preciosas. Todos em busca de riqueza, paz e tranqüilidade, como se costuma dizer. Todos fugidos de sua pátria, na maioria ladrões, assassinos ou abigeatários. Alguns poucos apenas dissidentes da religião oficial de seu país. Todos párias. Todos com histórias para contar ou para esconder.
Na região leste do país, montanhosa e constantemente açoitada pela chuva e pela neve, os italianos assentaram sua residência, junto com os velhos russos e alguns poucos franceses. Conviveram de forma pacífica, esfaqueando-se de vez em quando em algum bar ou esbofeteando-se em alguma praça de suas cidades bem arborizadas e de ruas largas. Vez ou outra um judeu queimava a casa de um italiano por conta de dívidas não pagas ou um italiano acabava com a família de um francês por não gostar de seu nariz, mas no geral tudo funcionava bem em tais comunidades. A terra era boa e fácil de cultivar, favorecia as plantações de uva, o que garantia o vinho que embebedava todos os moradores e os deixava ora mais sociáveis, ora mais selvagens. Suas línguas, porém nunca eram de todo amistosas. Sempre que alguém abria a boca na frente de um vizinho, a intenção era perversa.
Mais adentro do continente, longe dos portugueses que sempre se instalavam na costa, estes colonos faziam suas vidas retirando seu sustento da terra. Porém, numa espécie de círculo imaginário, rodeado por vários vilarejos, nada crescia. Nem mesmo vegetação rasteira. Um riacho pestilento traçava sua circunferência, imprecisa, mas inegável, separando o terreno infértil das terras produtivas. No inverno, o lugar era um verdadeiro lamaçal, intransitável a dois ou quatro pés. No verão era apenas pó. Ninguém conseguiria viver em terra tão estéril, diziam os italianos; não é possível construir nada, diziam os franceses; essa terra é amaldiçoada, diziam os judeus. Ainda assim, alguns poucos aventureiros tentaram estabelecer-se ali, sem muito sucesso. Suas casas afundavam durante o inverno, ou eram assolados por doenças e pestes durante o verão. No ano da Grande Insurreição, quando os russos tentaram um levante contra o governo, várias famílias fugiram do país deixando para trás suas casas e suas esperanças de um futuro promissor. Em contrapartida, surgiram levas de novos colonos, a maioria enviada para tentar reprimir o levante russo. Ingleses, franceses e espanhóis, o triunvirato que então governava o país, uniu esforços contra os russos, provocando uma verdadeira limpeza étnica. Nessa nova colonização vieram os mercenários e os catequistas. Além, é claro, de mais mão de obra especializada. Armeiros, construtores e varejistas. Terra de todos, terra de ninguém. Terra de bárbaros.
George Monty chegou nessa época. Lutou no Exército da Libertação, Primeiro Oficial Graduado da Vigésima Bateria de Infantaria Tática. Responsável pelo mapeamento da Terceira Seção Leste. Condecorado com Honra ao Mérito, a Medalha de São Miguel por valor em combate, a Medalha de São Conrado por liderança, por logística, por estratégia em combate e a Bala de Prata por inimigos abatidos.

Sonhos

Depois de uma noite mal dormida, Fagin acorda de mau humor, não querendo ver ninguém na sua frente. A vontade de ir trabalhar se foi junto com aquele horror de pesadelo da noite passada. O que era pior, uma certa sensação de dejá vu não saía de dentro de sua cabeça. O lugar ao qual ele estivera no sonho não lhe era de todo estranho, parece que o reconhecia de algum lugar, talvez de uma memória já distante que lutava dentro do seu subconsciente para vir á tona. Mais tarde se preocuparia com isto, agora era hora de mudar um pouco de cara, injetar uma dose ânimo e se preparar para o serviço no museu. Hoje seria o dia da inspeção do diretor geral, ele iria ver como estavam indo todos os funcionários, do posto mais alto ao mais baixo, e dependendo do posto que a pessoa ocupava a arrogância e o desprezo do diretor também aumentava. E pra agravar a situação Fagin era guarda de segurança no museu e logo no seu turno andavam sumindo algumas coisas do lugar, e hoje pelo jeito ele ia ter um dia extremamente cheio e estressante, um monte de pedidos de desculpas, esclarecimentos e promessas de cumprir o seu dever.
Todo o dia, por incrível que pareça, transcorreu bem. Logo que chegara ao museu Fagin descobrira que tinham pegado o meliante do museu, era uma moça, uma antiga funcionária do setor de guia para os visitantes que vinham visitar o local. Fagin sentira-se um pouco mais aliviado com a descoberta do ladrão, isto significava que hoje ele teria um dia de relativa paz, isto até a chegada do inspetor, bem até a visita dele poderia ser aturada hoje, pois agora este problema já não era da segurança. O senhor Eleaby, como era chamado o diretor-geral do museu, foi até que simpático e alegre com os funcionários durante sua visita. Mais tarde a menina do guichê, a universitária que havia começado a trabalhar há pouco tempo no museu tinha lhe falado que o senhor Eleaby tinha conseguido uma grande verba para o museu, e o motivo da sua alegria era apenas isso, a chance de ele poder mais uma vez aparecer para a alta sociedade.
Após sair do trabalho Fagin deu uma passada num bar para tomar um café e comer um sanduíche de salada antes de ir para casa descansar. No caminho de volta casa uma dor de cabeça começa a incomodar-lhe, mais e cada vez mais, chegando a um ponto de ser insuportável. Flashbacks invadem sua mente, enquanto tenta desesperadamente chegar em sua casa começa a ter visões do lugar o qual ele sonhara e do velho tentando agarrar-lhe, mas o que mais lhe encheu de angústia e terror foi à visão de um poço construído de pedras negras.
Fagin mal conseguiu abrir a porta de sua casa, pois, logo que ele entrou, a porta fechou-se por si só, e ele desmaiou...


Desaparecidos


George Monty ficou intrigado com as lendas do vilarejo sobre uma casa e um poço construídos num local onde nada nascia, crescia ou vivia lá. Movido por sua curiosidade George resolveu investigar um pouco mais sobre o local indagando os moradores mais antigos dali, claro que nunca diretamente, sempre no estilo conversa vai e conversa vem, toda vez dava um jeito de inserir este assunto no qual estava interessado no bate-papo.
As histórias eram muitas e remontavam há muitos anos atrás, algumas delas eram exageradas demais, só de ouvi-las já dava para se notar o alto grau de superstição do vilarejo local, mas em todas elas sempre tinha a presença do velho judeu e da construção da sua morada, dizem que ele permanecera no lugar durante trinta anos e depois sumira, ninguém mais tivera noticia ou tinha avistado ele em algum lugar.
Depois de muito escutar o povo local George ficara pensativo por alguns momentos enquanto sorvia vagarosamente a sua bebida, lhe era muito estranho e inverossímil esta história, pois todo lugar que se preze sempre tem suas lendas e fantasmas locais, este não era exceção. Mas mesmo assim algo o inquietava, o convidava a visitar o tal do lugar o qual o velho judeu vivera. Afinal depois de tanto pensar e remoer sobre o assunto, George resolvera ir nesta empreitada.
Ele iria esperar o dia amanhecer para seguir na direção a onde segundo o pessoal do vilarejo tinha indicado estava à velha construção, que alguns chamavam de “As terras Devastadas” [2] , os moradores o advertiram a não seguir adiante, a nem cogitar em chegar perto daquele local amaldiçoado e é claro que ele não seguira o conselho. Quando saiu do bar onde ele estava para ir descansar na sua casa, pois ele tinha passado do ponto, ou seja, bebido um pouco além da conta, algo o impeliu a ir à direção contrária a sua casa, bem onde pelas indicações iria encontrar o objeto de sua curiosidade.
- Bom... Pelo menos tenho minha lamparina comigo para iluminar o caminho – pensou um pouco, olhou ao redor e para cima, - se bem que com esta lua cheia não precisarei de iluminação nenhuma.
Ele levou sua mão a sua cintura e constatou que seu revólver e faca estavam com ele também, Como um bom soldado e oficial militar ele nunca esquecia suas armas em casa sempre as carregava consigo.
- Vamos Furacão, temos uma boa cavalgada pela frente e no escuro não vai ser nada fácil – falou George acariciando sua montaria.
Após uma hora de cavalgada o oficial Monty começou a notar a mudança de cenário, ao redor não existia nada a não ser uma pouca vegetação que ele podia ver na luz que sua lamparina alcançava e a luz da lua lhe permitia ver, era uma vegetação daninha e rala, tinha algumas árvores mortas e muito pó, areia de uma cor que aparentava sem vida, inócua. E nenhum ser vivo, nenhum uivo de lobos e cães selvagens ou de corujas que eram comuns neste local.
Seguindo adiante nada no cenário mudou. Mais uns minutos ele já podia enxergar o que um dia foi uma construção habitada. George desmonta de seu cavalo. Resolve seguir a pé, ele arreia o cavalo em uma árvore morta que tentou crescer ali, agora ela era nada mais que alguns troncos sem vida. Aos poucos outra forma foi se definindo diante dos olhos de George era um poço de pedras negras, pedras, aliás, que ele nunca tinha visto. Ao passar suas mãos ao redor do poço ele sentirá uma descarga elétrica percorrer todo seu corpo. Ele se distancia do poço um pouco desconcertado, espera um pouco para se recompor e segue adiante mantendo uma distância prudente do poço.
Quando se aproxima da casa um cheiro pútrido invade suas narinas fazendo-o se agachar e vomitar.
- Merda, alguma porra de animal deve ter morrido aí dentro.
Pegando um lenço do seu bolso para tapar o seu nariz e boca para evitar o cheiro pelo menos um pouco ele chegue para dentro da casa. Antes de tocar a maçaneta da porta ela escancara-se. George intriga-se com o ocorrido, mas logo a preocupação dissipou-se adentrou a casa.
- Deve ter sido o vento que abriu a porta e com essas casas antigas um vento basta para escancará-las – embora tenha racionalizado isto em sua mente, bem no fundo dela havia um aviso que desde que chegara ali não haveria nem menos uma brisa ao redor dele e pior nenhum barulho ou som apenas silêncio.
Agora o fedor era pior fazendo-o quase desmaiar, mas isso não iria afetar o grande oficial que residia nele, pois nada impedia o avanço do primeiro oficial George Monty. Segui caminhando durante um tempo que ele não soube precisar por um longo corredor até num dos lados dele ele achou uma porta que tinha iluminação por trás dela, novamente a sensação de urgência e perigo o invadiu, mas o que o impelia a seguir adiante era mais forte. Abriu a porta um clarão quase o cegou. Demorou um tempo para se acostumar com a claridade, notou que o fedor diminuiu um pouco agora seu nariz inalava apenas um cheiro azedo, mas mesmo assim também não era muito agradável do que o outro.
Quando conseguiu enxergar direito o que viu quase o fez perder a sanidade ele estava dentro do poço de pedras negras, mas só que o poço era enorme e havia algumas coisas dentro dele que não conseguia identificar. Os ângulos que ali se formava desafiavam qualquer lei da física. Ele estava de ponta cabeça em relação ao chão, se é que dava para dizer onde era o chão, e abaixo ou acima dele havia outro homem caído pelo que ele pode notar era jovem.

Sanidade


Fagin acorda e o que ele vê o enche de medo.
- Devo estar sonhando! Não pode ser, estou dentro do poço do meu sonho...
- Hei jovem! Hei jovem! Ajude-me a descer daqui! – George pede para o jovem que acabou de acordar.
- AAhhh – Fagin solta um grito e levanta-se sobressaltado. – Meu Deus! Onde estou quem é você?- ele dá uma olhada para as roupas do senhor que ali está. – E que droga de roupas são essas? E afinal como você foi parar aí? – Ele olha ao redor – Parece que estou numa pintura de Dali.
George acha estranhas as roupas do jovem e não entende quase nada do que ele lhe perguntou e o que ele falou a respeito “Dali” já que ele estava aqui, ao lado dele.
- Jovem rapaz não me pergunte nada, pois por ora estou tão confuso quanto vós! Só peço que me ajude!
- Bem... – após ponderar por um instante - está tudo bem!
Fagin segura os braços de George e lhe dá um puxão brusco os dois caem ao chão um encima do outro. Antes deles se recuperarem do tombo. Tudo no poço, a paisagem, o chão tudo é reconfigurado, eles estão num piso de pedra negra ainda, mas só num lado do poço. O outro lado é um caminho de terra e ao longe está um castelo, por mais que pareça loucura os dois homens pensam o que um castelo medieval está fazendo dentro de um poço, isto é insano.
Tudo acontece dentro de micro-segundos, os dois homens se vêem frente a um homem que os dois conhecem muito bem, seja por sonhos ou por lendas. Diante deles estava o judeu que construiu a casa e o poço, e dele vinha um fedor pútrido e emanava uma coisa má, não uma coisa má, pensam os dois homens quase que em conjunto, do judeu emanava o mal. Seu rosto estava todo negro e retorcido, seus olhos não existiam apenas dois buracos negros, sua boca esgarçava-se num sorriso de mil presas afiadas, suas mãos tinham unhas longas e retorcidas e pareciam umas garras.
Quando sua voz fez-se ouvida, George e Fagin estremeceram:
- Sejam bem-vindos ao meu mundo, ao mundo dos meus mestres! Vocês terão o prazer de conhecer e divertir os mestres do universo: os antigos!
Num instante Fagin e George se viram dentro da fortificação onde ficava o castelo. O movimento dentro do lugar era intenso, mulheres e crianças correndo para o lado oposto da muralha para uns abrigos subterrâneos enquanto os homens de armadura, arcos, flechas e lançam corriam para a direção contrária.
De repente um grito ensurdecedor percorre todo o lugar chegando a machucar os tímpanos, o mundo escurece, um fedor inimaginável percorre o ar. George e Fagin enxergam o judeu-demônio que agora está ao seu lado gargalhando.
Fagin é quem vê primeiro, os seus olhos esbugalham-se e de sua garganta sai um grito seco, o eco morre mesmo antes de sair, algo em sua mente se rompe e ele finalmente perde a sua sanidade. George após ver a careta de horror e os olhos agora aparentando vazio, ele tenta não olhar para o que amedrontou tanto seu jovem amigo, mas algo o impele, sempre há algo o impelindo e não é apenas a curiosidade. Subindo a muralha há um monstro gigantesco com vários braços e um olho enorme, não só o único olho é grande, mas seu tamanho é descomunal. O horror que George sente é indescritível, ele nunca esperara encontrar tamanha abominação. Onde ele está, onde foi parar seu mundo.
Tudo isto é completamente insano, ele entrou na casa e depois estava dentro daquele oco de pedras negras, aquele maldito poço. Na mente de George algo se rompe. No ar se esvai seu último grito de sanidade.


[1] “Penso logo Existo” – René Descartes, Filósofo (1596- 1650).
[2] Alusão ao poema de T.S. Elliot e também a saga: Torre Negra Volume III de Stephen King.